O Centro de Estudos da Federação Académica do Porto fez um retrato da evolução do sistema de ação social desde a década de 90. As conclusões são apresentas, esta quarta-feira, no Instituto Politécnico do Porto.
O sistema de ação social está mais «célere» e «uniforme». No entanto, mostra-se, cada vez mais, «exigente» no momento de atribuir a bolsa. Hoje, é mais difícil aceder ao apoio financeiro, seja em termos de aproveitamento escolar, seja na contabilização dos rendimentos das famílias. O grau de carência económica é «muito mais severo» do que no passado.
O estudante precisa de enfrentar quase duas vezes mais dificuldades económicas para ter acesso à bolsa. «Na prática, até 2010 o estudante que recebia a bolsa mínima tinha quase o dobro dos rendimentos daquele que hoje recebe bolsa mínima». A conclusão parte do Centro de Estudos da Federação Académica do Porto (FAP), que analisou os dados estatísticos e regulamentares do sistema de bolsas, referentes aos últimos 20 anos.
«A grande alteração que, neste momento, faz falta ao sistema e que o tornaria mais justo é efetivamente a alteração da contabilização dos rendimentos», defende Daniel Freitas, presidente da FAP, em declarações ao Canal Superior.
Tal como defendido noutras ocasiões pelo movimento associativo nacional, o dirigente estudantil reforça ser «urgente a contabilização dos rendimentos líquidos em detrimento dos ilíquidos», no sentido de «cessar definitivamente a contabilização artificial de rendimentos que efetivamente não estão disponíveis pelas famílias para investimento em educação».
Tendo em conta a evolução do sistema de ação social desde a década de 90, o estudo da FAP constata, ainda, que o número de bolseiros quintuplicou, passando de 10.943 (1990/91) para 63.289 (2014/2015).
A percentagem de bolsas atribuídas é mais elevada no caso do ensino público e, dentro deste subsistema, são os politécnicos que reúnem o maior número de bolseiros. Em termos nacionais, as instituições localizadas «fora das grandes áreas urbanas, no interior do país ou nas regiões autónomas são regularmente aquelas que têm maior percentagem de estudantes bolseiros», à exceção da Universidade do Minho e da Escola Superior de Enfermagem do Porto.
Porém, a quantidade de estudantes com acesso ao apoio financeiro subiu a um «ritmo muito mais acelerado» do que o número de inscritos no Ensino Superior. «Entre 1990/91 e 2014/2015, o número de inscritos cresceu 98% e o número de bolseiros cresceu 478%», lê-se no estudo da FAP, a que o Canal Superior teve acesso.
«Mas essa mais-valia perde-se a partir de 2010, havendo uma quebra acentuada nos apoios concedidos, o que destrói qualquer impacto que poderia haver deste crescimento», critica Daniel Freitas.
27 mudanças no sistema de bolsas
A «volatilidade constante» nas alterações do quadro legal e regulamentar do sistema de atribuição de bolsas trata-se de outro fator de «instabilidade» no sistema.
Desde 1977, segundo a FAP, as regras de acesso à bolsa foram alteradas 27 vezes. «O pior é mesmo a desigualdade que se cria. As alterações constantes, quando são positivas, acrescem o número de estudantes, mas quando são para reduzir, afastam estudantes que contavam já com esse apoio», frisa o presidente da FAP.
A mais recente alteração ocorreu em 2015 e resultou no aumento do limiar da elegibilidade do estudante e na modificação do cálculo de contabilização de rendimentos empresariais e profissionais.
José Ferreira Gomes, ex-secretário de Estado de Ensino Superior e docente da Universidade do Porto, acredita que Portugal tem, atualmente, um «sistema equitativo a nível nacional e bem ajustado no seu funcionamento».
«Um sistema nacional de apoio terá sempre de ter regras gerais e firmes para evitar a fraude e o 'aproveitamento' por estudantes que não têm necessidades efetivas», considera.
O antigo governante defende que, «apesar da correção orçamental» da última legislatura, o Governo foi capaz de «melhorar progressivamente o número de beneficiários e o valor médio da bolsa enquanto o tempo de resposta foi o menor de sempre».
Também Daniel Freitas, presidente da FAP, assinala a «evolução positiva do quadro global [do sistema da ação social] e a diminuição do tempo médio de resposta» por parte dos Serviços de Ação Social e da Direção-Geral de Ensino Superior.
Todos os resultados do estudo «Bolsas de estudo no Ensino Superior - Duas décadas depois» serão apresentado esta quarta-feira, a partir das 15 horas, na Sala de Atos do Instituto Politécnico do Porto. A apresentação será conduzida pelo presidente da FAP, Daniel Freitas, e conta com os comentários de José Ferreira Gomes e João Queiroz, diretor-geral do Ensino Superior.